Apesar de avanços pontuais, o produtor rural brasileiro ainda cultiva sob risco. Dados recentes do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), compilados por plataformas de inteligência territorial, mostram que apenas 14% da área agrícola cultivada no país está coberta por apólices de seguro. Isso significa que mais de 86% das lavouras seguem expostas a perdas financeiras causadas por eventos climáticos — uma ameaça cada vez mais concreta diante das projeções de aquecimento global.
Embora estados como Rio Grande do Sul e Paraná apresentem índices relativamente melhores de adesão, com percentuais que ultrapassam os 20% em algumas regiões produtoras, outros estados-chave para o agronegócio, como São Paulo, Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, enfrentam um cenário de subseguro alarmante. Em São Paulo, mais de 91% das propriedades rurais não contam com qualquer proteção formal. Em Goiás, o índice chega a quase 90%.
A situação é especialmente preocupante em áreas de expansão agrícola e com maior incidência de extremos climáticos, como no Centro-Oeste e em parte do Sudeste. Mesmo com as seguidas estiagens, picos de calor e chuvas intensas que têm afetado a produção, o acesso ao seguro ainda é restrito e, na maioria dos casos, baseado em modelos padronizados que não consideram as particularidades de cada região.
Mudança no clima – Um estudo publicado pela Organização Meteorológica Mundial nesta semana reforça o alerta: há 80% de chance de que o mundo registre novos recordes de temperatura nos próximos cinco anos, rompendo a barreira de 1,5ºC de aumento em relação aos níveis pré-industriais. O Brasil, como grande exportador de alimentos, sentirá esses efeitos no campo. Estiagens prolongadas, calor excessivo e volumes de chuva irregulares podem afetar diretamente as safras e a estabilidade dos preços.
Nesse contexto, cresce a demanda por soluções baseadas em dados — com uso de inteligência territorial, mapeamento de risco e análises históricas — capazes de embasar ofertas de seguros mais eficazes e adaptadas à realidade de cada propriedade. Iniciativas privadas e consórcios entre seguradoras, cooperativas e governos têm buscado ampliar o alcance dessas ferramentas, mas ainda enfrentam entraves regulatórios, falta de informação técnica e baixa penetração entre pequenos e médios produtores.
A proximidade do lançamento do Plano Safra 2025/26 reacende o debate sobre a ampliação dos recursos destinados ao Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR). A última edição, embora tenha registrado crescimento, não foi suficiente para alcançar todos os interessados, e muitas propostas ficaram fora por limitação orçamentária. O setor pede previsibilidade, ampliação da verba e simplificação do acesso, especialmente para produtores que ainda desconhecem os mecanismos de contratação.
Enquanto isso, a insegurança no campo segue sendo uma realidade. Em estados com cobertura acima da média, como o Rio Grande do Sul, produtores relatam maior tranquilidade para enfrentar eventos extremos. Já em regiões com baixa penetração, a recuperação após perdas climáticas costuma ser lenta e custosa — com impacto direto sobre a rentabilidade, a capacidade de investimento e o abastecimento interno.
Com o agro respondendo por cerca de 27% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e quase 10% das exportações mundiais do setor, o subseguro rural deixa de ser apenas um problema de gestão individual para se tornar um fator de risco sistêmico. Sem proteção ampla, o país arrisca comprometer sua segurança alimentar, sua competitividade internacional e sua estabilidade econômica em períodos de instabilidade climática.
O desafio agora não é apenas cobrir mais, mas cobrir melhor: com inteligência, dados precisos, estímulos consistentes e políticas públicas que integrem o seguro rural à estrutura de financiamento da produção. O clima mudou — e a resposta precisa acompanhar o ritmo da ameaça.