Mesmo com o reajuste nas tarifas pagas por serviços de armazenagem agrícola, o Brasil segue enfrentando um dos maiores gargalos da cadeia produtiva rural: a insuficiência estrutural de silos e estruturas de estocagem. A nova tabela da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em vigor desde 1º de maio, busca tornar mais atrativa a prestação de serviços por armazéns privados, mas especialistas do setor alertam que o problema vai além de remuneração — falta infraestrutura.
A estimativa de uma safra recorde, que pode ultrapassar 330 milhões de toneladas em 2024, coloca ainda mais pressão sobre um sistema que já opera no limite. Hoje, a capacidade estática de armazenagem no país não acompanha o crescimento da produção. Segundo diretrizes da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), o ideal seria que o país tivesse capacidade para armazenar 20% mais do que sua produção anual. No caso brasileiro, isso significaria cerca de 400 milhões de toneladas. O déficit atual, portanto, é estrutural — e significativo.
O reajuste médio de 6,88% cobre diferentes operações, incluindo grãos ensacados (19,12%), café, arroz e fibras a granel (8,04%), e serviços de recepção e expedição, com altas entre 2,42% e 2,97%. O arroz a granel teve aumento de 30%, devido ao maior desgaste que provoca nos equipamentos.
A Conab aposta que a atualização dos valores vai atrair novos parceiros privados para sua rede credenciada, que hoje possui capacidade três vezes maior que a da rede própria. O modelo de remuneração permanece baseado em contratação por demanda: o pagamento só ocorre quando há uso efetivo do serviço.
Ainda assim, o mapa da armazenagem brasileira revela desequilíbrios. Estados como Mato Grosso, Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul concentram estruturas credenciadas, enquanto novas fronteiras agrícolas — como Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e Sealba (Sergipe, Alagoas e Bahia) — seguem com baixa cobertura. Nessas regiões, o custo logístico e a distância de centros consumidores tornam o armazenamento ainda mais estratégico.
Para os produtores, especialmente os médios e pequenos, o problema se traduz em perdas e improvisações. Sem onde guardar a produção, muitos acabam obrigados a vender no pico da colheita, quando os preços estão mais baixos. A dependência de estruturas terceirizadas, muitas vezes localizadas longe das propriedades, também aumenta o custo operacional, sobretudo com o frete.
Ainda que a Conab mantenha uma tabela única de tarifas válida em todo o território nacional — o que garante isonomia nos pagamentos —, isso não resolve o desafio da descentralização da infraestrutura. A questão é de investimento direto em construção de novos silos, e não apenas de intermediação via contratos com armazéns já existentes.
Enquanto a política pública se concentra em tornar mais eficiente a utilização do que já existe, o produtor segue lidando com uma realidade em que produzir mais não significa, necessariamente, colher melhores resultados.